Alta nas ações não resolve problemas da GameStop

Modelo de negócios precisa ser repensado
01/02/2021
POR
Carlos Silva
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A rede norte-americana GameStop foi destaque nos noticiários de todo o mundo na última semana, após ser alvo de uma disputada aposta na bolsa de valores de Nova York.

O esquema, envolvendo de um lado grandes fundos de investimento que apostavam na desvalorização das ações da GameStop, e do outro lado milhares de pequenos investidores agindo de forma coordenada através de um fórum no Reddit, levantou discussões sobre regulamentação de apps de investimento versus liberdade de mercado, grandes capitalistas versus o homem comum, etc, que estão longe de chegar ao fim.

Nesse meio tempo, as ações da GameStop em Wall Street oscilam de valor diariamente, mas devem, em pouco tempo, voltar a cair – e a queda pode ser bem feia. Isso porque a valorização dos papéis da cadeia de lojas nada teve a ver com decisões ou mudanças adotadas pela empresa. Seu valor foi inflado artificialmente, da mesma forma que aconteceu com a rede de cinema AMC mais ou menos na mesma época.

O que as duas empresas tem em comum? Modelos de negócios defasados, que já vinham sendo afetados pela mudança de comportamento do consumidor, ascensão de novos entrantes em seus mercados e, finalmente, por portas fechadas em grande escala no último ano, por conta da pandemia de Covid-19.

O negócio da GameStop

A GameStop é uma rede de varejo “brick and mortar“, ou como a gente chama por aqui, lojas físicas. A rede está presente em vários países além dos EUA, mas por lá é praticamente uma instituição, como padaria e banca de jornal aqui no Brasil.

A rede viveu seu auge na época do PlayStation 3, Wii e Xbox 360, com grandes filas nas portas das lojas para comprar novos consoles e jogos super aguardados nos dias dos lançamentos. Também adquiria e revendia consoles usados e, principalmente, jogos. Boa parte das prateleiras das suas lojas eram ocupadas por games usados, revendidos por preços muito mais em conta.

Cesta de jogos usados em loja da GameStop (Reprodução)

O varejo de jogos usados na GameStop sempre dividiu opiniões, afinal as publishers não recebem nada pela venda deles. Para não ficar dúvidas: em 2019, a rede tinha uma margem de lucro de 42.7% com jogos usados, contra 23% na venda de games novos.

A questão foi motivo de uma queda de braço no início da geração seguinte, quando a Microsoft anunciou que o Xbox One teria restrições para rodar jogos usados (ou emprestados), através de uma verificação de licença online.

A Sony levou um bom tempo para revelar qual seria a política do PlayStation 4 para jogos usados, e o fez com uma alfinetada na concorrente em sua conferência na E3 2013. Veja no vídeo abaixo:

Na época, circulava o rumor de que o PS4 seguiria o mesmo caminho do Xbox One, mas a pressão nas redes sociais (e de varejistas) teria levado a Sony na direção oposta e, na sequência, a Microsoft também.

Por uns anos, tudo permaneceu mais ou menos igual ao que era antes, mas a ascensão dos games como serviço, com fortes componentes online e que seguram o jogador por meses (ou anos) com o mesmo jogo, dos jogos gratuitos e a popularização da distribuição online, acabaram afetando o modelo de negócio de vendas de usados da GameStop. Não existem “jogos digitais usados”, então mesmo quando o jogador para de jogar, ele não pode repassar o jogo para a loja colocar na prateleira.

Não é de hoje que o principal negócio da GameStop enfrenta problemas. A queda na venda de usados é uma constante nos resultados da empresa desde 2016.

Com a pandemia, as coisas só pioraram, pois mesmo o público habituado a comprar jogos em disco, edições especiais com caixas cheias de extras e novos consoles, optou em sua maioria, pela praticidade e segurança online. E se 2020 foi um ano de muito crescimento no setor de jogos para essas lojas, o mesmo não aconteceu com a GameStop: em dezembro, a rede anunciou o fechamento de 5 mil unidades ao redor do mundo.

A GameStop pode fechar quantas lojas quiser para reduzir custos, mas isso não vai fazer os negócios melhorarem. Há quem diga que esse é o prenúncio do fim para uma empresa do varejo.

Experiências de consumo

Em julho de 2019, a GameStop anunciou que estava dando os primeiros passos na reinvenção do seu negócio, criando novos conceitos de loja para oferecer experiências de consumo diferenciadas para o público gamer. O objetivo declarado: “reafirmar sua posição na cultura gamer”.

Entre as lojas conceito desenvolvidas em Chicago e Austin, nos EUA, com uma versão especializada em jogos e aparelhos retrô, outra com ligas locais de eSport ou mesmo novas formas do jogador experimentar os games antes de comprar.

Loja conceito da GameStop tem espaço para torneios de Fortnite (Reprodução)

Buscar oferecer um valor agregado maior do que o que o cliente vai encontrar na tela das lojas online é o caminho mais acertado para o varejo tradicional, disso não há dúvida. Mas talvez a GameStop devesse ter começado a trabalhar nessa reinvenção uns 5 anos atrás.

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